domingo, 19 de março de 2017

A importância e o exemplo de São José

Quando Deus deseja que alguém dê conta de determinada missão, oferece-lhe todas as graças necessárias para que ela seja cumprida. Depois de Maria, que levou Cristo no próprio ventre, ninguém teve missão tão importante quanto José. Aquele simples e humilde carpinteiro de Nazaré passou grande parte da vida ao lado da Virgem e do Salvador, servindo-lhes de guardião. Não houve, além de Maria, santo tão importante quanto são José. Ele foi maior que todos os apóstolos, foi maior que todos os profetas. 
Quantas graças esse homem não recebeu apenas por conviver e escutar Nossa Senhora? E ao meditar sobre os passos e o mistério daquele Menino que se desenvolvia diante de seus olhos? Como não deve ter crescido em santidade e em perfeição?
Por muitas razões, são José é modelo para todos os cristãos. Em primeiro lugar, destacou-se por sua obediência à vontade de Deus. Tudo o que Deus lhe pediu, José fez: aceitou Maria como esposa, assumiu o Menino, partiu para Belém, foi ao Egito, voltou a Nazaré... Como um garotinho dócil, nunca questionou seu Criador, nunca pediu explicações, nunca se rebelou, nunca fez corpo mole.. Mesmo com tantos motivos, José nunca duvidou ou desanimou. 

São José: o homem simples que aceitou a missão de ser pai do Filho de Deus. Rio de Janeiro: Petra, 2016. 

sexta-feira, 17 de março de 2017

Prioridade da vida interior sobre a vida ativa

Em Deus está a vida, toda a vida. Ele é a própria vida. Ora, não é nas obras exteriores, como a Criação, que o Ser infinito manifesta essa vida do modo mais intenso, mas sim no que a teologia chama operações ad intra: essa atividade inefável cujo termo é a geração perpétua do Filho e a incessante processão do Espírito Santo. Essa é, por excelência, a sua obra essencial, eterna. 
A vida terrena de Nosso Senhor Jesus Cristo foi a realização perfeita do plano divino. Trinta anos de recolhimento, seguidos de quarenta dias de retiro e penitência, prepararam a sua curta carreira evangélica; e, durante as suas jornadas apostólicas, quantas vezes ainda, O vemos retirar-se para as montanhas ou para os desertos, a fim de orar: "Ele retirava-se para lugares solitários e entregava-Se aí à oração" (Lc 5, 16). Ou passar a noite a rezar: "Naqueles dias, Jesus foi para o monte a fim de fazer oração, e passou a noite a orar a Deus" (Lc 6,12). Rasgo ainda mais significativo: Marta deseja que o Senhor, condenando a suposta ociosidade da sua irmã, proclame a superioridade da vida ativa; a resposta de Jesus: "Maria escolheu a melhor parte" (Lc 10, 42), consagra a importância da vida interior. Jesus quis, pois, fazer-nos ver, claramente, a preponderância da vida de oração sobre a vida ativa. 
Os Apóstolos, fiéis aos exemplos do Mestre, reservaram para si o ofício da oração e o ministério da palavra, deixando as ocupações mais exteriores aos diáconos: "Quanto a nós, entregar-nos-emos, assiduamente, à oração e ao exercício da palavra" (At 6,4). 
Os Papas, os santos doutores e os teólogos afirmam, por sua vez, que a vida interior é superior à vida ativa.

CHAUTARD, Jean-Baptiste. A alma de todo o apostolado. São Paulo: Artpress. 2015. 

terça-feira, 14 de março de 2017

Sagrada Escritura

Estudar a Sagrada Escritura é estudar o mais belo que existe. Hoje se ouve dizer com frequência: "Deus já não fala em nosso mundo; está calado". Não é certo! Deus sempre falou e segue falando. Faz isto através da sua Palavra contida na Bíblia. 
Queremos escutar a Deus? Abramos a Sagrada Escritura. Aí está tudo o que devemos fazer para chegarmos ao céu. Aí está o caminho para a verdadeira felicidade. Aí está a solução para todos nossos problemas. Só temos que abrir, ler, meditar, interiorizar, viver e transmitir essa mensagem de Deus para nós. 
A Bíblia não é letra morta ou muda. Ela nos interroga, interpela, anima, acusa, ensina, admoesta. A quem medita a Bíblia lhe acontecerá o que aconteceu aos discípulos de Emaús, cujos corações ardiam quando Jesus lhes explicou as Escrituras pelo caminho da vida (cf. Lc 24, 13-15). 
Abrir a Bíblia é se comprometer com Deus, que nos fala. Não se pode se aproximar da Bíblia como curioso, mas sim como criatura diante do Criador, como filho diante do seu Pai, como servo diante do seu Senhor. "Fala, Senhor, que o teu servo escuta". A Bíblia é um livro, não só para estudar, mas também para meditar, viver e transmitir. "Bem- aventurados os que escutam a Palavra de Deus e a põem em prática". (Lc 11, 28). 

RIVERO, Antonio. CURSO BÍBLICO PARA LEIGOS. A RIQUEZA DA PALAVRA DE DEUS ANTIGO E NOVO TESTAMENTO. Juiz de Fora: Martyria. 2014. 

domingo, 12 de março de 2017

O que significa ser santo?

Ao definir o que significa ser santo, corremos o risco de deturpar a realidade, acomodando ao nosso próprio conceito. Santo é uma destas palavras, como tantas outras, cujo sentido foi se transformando através dos tempos; antes temperança significava apenas abstinência de bebida, hoje caridade suscita a ideia de esmola e liberal lembra política. Atualmente ser santo não é algo muito apreciado; devoção e beatice tem significado pejorativo, parecem sugerir hipocrisia ou retrocesso. 
Não é normal apresentar alguém, dizendo: Tenho a honra de apresentar fulano, um grande santo; ficaríamos espantados se escutássemos que uma atriz, um jogador de futebol ou um político é um santo. Mesmo quando se diz que um homem é santo, significa que tal pessoa é um excelente amigo, com ideais superiores. Quando um homem responde com naturalidade: na verdade não sou santo, porém trabalho para ser; tal pessoa presta homenagem aos santos, confessa implicitamente quão longe se encontra da perfeição, sem querer passar por vaidoso ou crítico. 
Os santos foram homens de carne e osso! Não são personagens fictícias!
Muitos santos foram completamente desconhecidos ou a história pouco fala a respeito. São como os incontáveis soldados mortos nas guerras, em cujos túmulos se encontram as palavras: Conhecido só por Deus. 

MARTINDALE, Charles. A santidade através dos tempos. O que significa ser santo? São Paulo: Ecclesiae. 2010

sábado, 11 de março de 2017

O amolecimento dos bons

Ocorre-me uma palavra de Pio XII que cito de memória: "tenho medo do cansaço dos bons". O grande Papa que ainda sabia que "viver é lutar" e que a vida vivida na sequela de Cristo é um combate, um bom e árduo combate, "uma guerra sem tréguas contra três cruéis inimigos: o mundo, o demônio e o amor-próprio", se ainda hoje vivesse e reinasse, certamente repetiria seu grito de alarme em vários tons e com maior severidade: "o que mais temo não é só o cansaço dos católicos conscientes, é a moleza, é a pusilanimidade, é a tolerância ditada pela covardia, erigida em sistema e vista como a maior virtude do novo humanismo". 
Aos católicos que ainda não se transmutaram, e que não esqueceram a língua de Deus, não precisaria citar I Mac III, 59. Cito a conhecida passagem pelo amoroso gosto de escrever com meus garranchos e meu resto de vida estas belas palavras do Livro Santo: "Para nós é melhor morrer na guerra do que ver o mal de nossa gente e das coisas santas". Dos Macabeus ao apóstolo Paulo, que se alegrava de ter combatido o bom combate, vê-se a inflexível direção da História Sagrada que ganha nova dimensão na Encarnação de Cristo e culmina na Cruz e só terminará, não no dia de um Congresso Ecumênico que festejasse la réussite de l´homme, mas, ao contrário, na espantosa e terrível separação que desde já, no temor e tremor, nos lembra que o seu critério é o da sujeição à vontade de Deus, e não o da fraternidade de irmãos de pai desconhecido. 
É claro que a luta a que nos referimos, quando dizemos que viver é lutar, é mais espiritual do que temporal. O apóstolo Paulo diz: "Porque nós não temos que lutar somente contra a carne e o sangue, mas sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra os espíritos malignos espalhados pelos ares". Por isso tornamos a dizer o que dias atrás já dissemos e que, nos frutuosos tempos de quaresma, convém repetir: a melhor luta que devemos travar para o bem de nossos irmãos e para o agrado de Deus é a de nossa santificação pessoal que nos obriga a colocar a defesa das coisas santas acima de todos os problemas temporais. Sim: a luta pela santificação é o meu primeiro dever em relação a Deus e ao próximo. 

CORÇÃO, Gustavo. Uma teologia da história. Niterói: Permanência. 2015

sexta-feira, 10 de março de 2017

Testemunhas na era pagã

A cena muda, mas as divisões persistem. Todavia, o contexto em que a Igreja atua é um mundo já pagão...

Joseph Ratzinger -  Sem dúvida, a descristianização chegou a níveis que não conseguiríamos imaginar na época do encerramento do Concílio. Basta pensar que na ex-Alemanha comunista pouco menos de 1% da população se batiza. Assistimos a um progresso incrível do paganismo, e o cristianismo, que ainda parecia presente há trinta anos, desaparece da vida e da consciência pública. Assim, temos que nos confrontar com um pós-cristianismo muito forte não só no Ocidente mas também no Oriente. Basta pensar na Rússia, onde encontramos a mesma situação: existe um núcleo de fiéis, mas a grande maioria quase não é tocada pelo Evangelho. Por isso, nasce uma exigência de uma real nova evangelização, que se dirija a essas pessoas distantes do cristianismo, embebidas de secularismo, que devem ser aproximadas da realidade divina. Essa é a grande missão para os próximos anos. 

Hoje, todas falam de nova evangelização, mas ela pode se tornar uma palavra de ordem. O que significa evangelizar? Como pode acontecer a fé para o homem de hoje?

Joseph Ratzinger: Creio que as testemunhas são a primeira condição para essa evangelização. Pessoas que, vivendo a fé e verificando-a na sua vida, mostrem com clareza que a fé faz viver e possibilita uma vida autenticamente humana na comunhão e na comunidade. Só assim o conteúdo da mensagem torna-se compreensível. Por isso, precisamos de núcleos de cristãos onde essa verificação da fé na vida - pessoal e comunitária - se realize e ofereça a todos uma experiência cujas raízes vale a pena conhecer. 

RATZINGER, Joseph (Bento XVI). Ser cristão na era neopagã - vol.3: entrevistas (1986-2003) / Cardeal Ratzinger; organização, apresentação e notas de Rudy Albino de Assunção - Campinas, SP: Ecclesiae, 2016. 

quinta-feira, 9 de março de 2017

Aborto

O aborto é entendido como a interrupção da gravidez quando o feto ainda não é viável, isto é, não pode subsistir fora do útero materno. Pode ser classificado em: 
- Espontâneo: a interrupção da gravidez acontece por causas naturais sem a livre intervenção humana. Causa: normalmente é a má formação do próprio embrião (estudos mostram que ocorrem de 10 a 15% de abortos de todas as concepções). 
- Provocado: é realizado pela livre intervenção da pessoa humana. Deve haver um ato positivo, isto é, uma ação para que ele aconteça. As razões que provocam o aborto são normalmente chamadas de indicações. 
Quando o aborto é provocado, existem duas formas de colaboração: 
Formal: colaboração direta e intencional. Ela é imoral e ilícita. É feita por médicos, familiares, parentes, namorados, esposos, legisladores, advogados etc. que realizam, que agem diretamente, incentivam, apoiam o aborto ou induzem a ele. 
Material: colaboração indireta e não-intencional. São ilícitas as atividades que não têm outra finalidade do que preparar as condições para o aborto: cirurgiões, ajudantes, médicos assistentes, ginecologistas presentes na execução, anestesistas, juiz tutelar em caso de menores ou deficientes mentais etc. 

COELHO, Mário Marcelo Pe. O que a Igreja ensina sobre... São Paulo: Canção Nova: 2016. 

quarta-feira, 8 de março de 2017

Por que e como devemos amar a Deus

Queres então saber de mim por qual motivo e em que medida devemos amar a Deus? Bem, digo que o motivo de nosso amor por Deus é o próprio Deus, e que a medida desse amor é amar sem medida. Está suficientemente claro? Sim, talvez, para um homem inteligente, mas devo falar para sábios e ignorantes, e se já disse de modo claro para os primeiros, devo também considerar os segundos. É então para eles que vou desenvolver minhas ideias, e procurar aprofundá-las. Digo que temos duas razões para Deus ser amado por si mesmo: não há nada de mais justo e nada de mais vantajoso. Com efeito, esta pergunta "por que devemos amar a Deus"? apresenta-se sob dois aspectos: por que Deus merece vosso amor, e que vantagem temos em amá-lo. Vejo uma resposta para ambas: a razão pelo qual devemos amar a Deus é ele mesmo. Do ponto de vista do merecimento, o grandioso Deus se deu a nós, a despeito de nossa indignidade. Com efeito, o que poderia nos dar que valesse mais do que ele mesmo? Quando perguntamos quais razões temos para amar a Deus, e como adquiriu o direito ao nosso amor, constatamos que a principal é que ele nos amou primeiro. Merece, então, nossa retribuição, sobretudo se consideramos quem é aquele que ama, quem são os amados e como os ama. Quem é, com efeito, aquele que nos ama? É aquele a quem todo espírito presta este testemunho: "És meu Deus, e não precisas do que tenho" (Sl 15,2). E esse amor em Deus não é a verdadeira caridade, visto que não ocorre por interesse? Mas a quem se dirige esse amor gratuito? O Apóstolo responde: "Quando éramos inimigos de Deus é que nos reconciliamos com ele" (Rm 5,10). Deus nos amou com um amor gratuito, mesmo sendo seus inimigos. 

SÃO BERNARDO DE CLARAVAL. Tratado sobre o Amor de Deus. São Paulo: Paulus. 2015

terça-feira, 7 de março de 2017

Limitações e liberdade do ser humano

É com a tentação de Israel em mente que a Sagrada Escritura retrata a tentação de Adão e, em geral, a natureza da tentação e do pecado em qualquer idade. A tentação não começa com a negação de Deus e com a queda direta num ateísmo. A serpente não nega Deus, aparentemente: começa antes com um pedido perfeitamente razoável de informação que, na realidade, contém uma insinuação provocadora do ser humano e o atrai da confiança à desconfiança: "É verdade ter-vos Deus proibido de comer o fruto de alguma árvore do jardim?" (Gn 3,1). A primeira coisa não é a negação de Deus, mas a dúvida acerca da sua aliança, acerca da comunidade de fé e oração, dos mandamentos, de tudo quanto é contexto para viver a aliança de Deus. Existe, de fato, uma grande iluminação quando se duvida da aliança, se experimenta a desconfiança, se exige liberdade e se renuncia a obedecer à aliança como se ela fosse um colete de forças que impede o gozo das reais promessas da vida. É tão fácil convencer as pessoas de que essa aliança não é um dom, mas antes uma expressão de inveja relativamente à humanidade, que rouba aos seres humanos a liberdade, bem como as coisas mais preciosas da vida. Com esta dúvida, as pessoas ficam no bom caminho para construírem os seus mundos. Por outas palavras, é então que tomam a decisão de não aceitar as limitações da sua existência; é então que decidem não se deixar amarrar pelas limitações impostas pelo bem e pelo mal, ou pela moralidade em geral, mas, muito simplesmente, se libertam a sia mesmo mas ignorando-as.

RATZINGER, Joseph. No princípio Deus criou o céu e a terra. Portugal: Principia. 2013

segunda-feira, 6 de março de 2017

CRISTO

A pergunta pode ser feita dentro de um sentido plenamente cristão: o Filho de Deus fez-se homem para agir ou para morrer? Vários Padres da Igreja - como Tertuliano, Gregório de Nissa e Leão Magno - responderam sem hesitação: ele nasceu para poder morrer. 
Enquanto ele agiu, ao longo de sua vida, sua obra foi um fracasso, e quanto mais amorosamente se arriscou, mais claramente foi rejeitado. Qual a razão disso? A resposta poderia ser resumida em uma frase: toda a sua ação terrena se deu, desde o princípio, na plena autoentrega a seu Pai celestial, e esse autoentrega encontrou o seu ponto culminante e, com isso, também a sua plena realização, na Cruz. 
Essa resposta soa enigmática em sua brevidade, e, de fato, para compreendê-la plenamente, falta-nos um conceito. Jesus afirma que não veio para fazer a Sua vontade, mas a vontade daquele que o enviou. Esse seria o seu alimento. O conceito que nos falta é aquele da Missão. Com ele, conseguimos vislumbrar, de longe, a unidade que procuramos.:
Porque Jesus, o Filho de Deus, está aqui apenas para cumprir, em sua obra e seu amor, uma missão de Deus. Ele levará essa missão tão a sério quanto possível; não se pode falar, aqui, de um distanciamento interior da missão. 
Porque Jesus sempre identificou todo o seu "eu" com sua missão, ele também se abandonou à vontade do Pai. Ele não pode retroceder para uma esfera anterior à sua missão para encontrar o seu "ego", para encontrar-se a si mesmo. 
Mas em que consiste a missão? Consiste nisso, que ele reconcilie o mundo afastado de Deus - por meio de seu amor que chega ao mais extremo dos extremos - com o seu Criador, o que só será possível pelo fato de ele tomar sobre si todo esse sofrimento, suportando-o (como que através de um eclipse de Deus) até o fim, e com efeito, até além do seu fim, pois sua obediência amorosa é, de fato, mais profunda e definitiva do que toda a rebelião do pecado consegue ser. 

BALTHAZAR. Hans Urs von. Vida a partir da Morte. Meditações sobre o mistério pascal. São Paulo: Paulus. 2016. 

domingo, 5 de março de 2017

Perseverar até o fim

Vigie sobre a vida uns dos outros. Não deixe que sua lâmpada se apague, nem afrouxe o cinto dos rins. Fique preparado porque você não sabe a que horas nosso Senhor chegará.
Reúna-se com freqüência para que, juntos, procurem o que convém a vocês; porque de nada lhe servirá todo o tempo que viveu a fé se no último instante não estiver perfeito.
De fato, nos últimos dias se multiplicarão os falsos profetas e os corruptores, as ovelhas se transformarão em lobos e o amor se converterá em ódio.
Aumentando a injustiça, os homens se odiarão, se perseguirão e se trairão mutuamente. Então o sedutor do mundo aparecerá, como se fosse o Filho de Deus, e fará sinais e prodígios. A terra será entregue em suas mãos e cometerá crimes como jamais foram cometidos desde o começo do mundo.
Então toda criatura humana passará pela prova de fogo e muitos, escandalizados, perecerão. No entanto, aqueles que permanecerem firmes na fé serão salvos por aquele que os outros amaldiçoam.
Então aparecerão os sinais da verdade: primeiro, o sinal da abertura no céu; depois, o sinal do toque da trombeta; e, em terceiro, a ressurreição dos mortos. Sim, a ressurreição, mas não de todos, conforme foi dito: "O Senhor virá e todos os santos estarão com ele". Então o mundo assistirá o Senhor chegando sobre as nuvens do céu.

DIDAQUÉ - A doutrina dos Apóstolos. São Paulo: Livre. 2016

sábado, 4 de março de 2017

A cura dos ferimentos sofridos na vida

Um dos empecilhos que sempre preocupa os monges é o sentimento da tristeza. Num apotegma se diz: 'Pai Poimen foi questionado por um irmão: "Pai, o que devo fazer, pois sou abatido pela tristeza?" O ancião lhe respondeu: "Não olhes para ninguém à toa, não julgues ninguém, não calunies ninguém e o Senhor te dará repouso". 
Aqui não se propõe nenhum método sobre o melhor modo de lidar comigo mesmo, como devo ver um mim mesmo a positividade, mas, de forma paradoxal, um comportamento em relação ao outro. Livro-me de minha tristeza quando não julgar os outros. Aqui, seguramente, a tristeza está estritamente ligada ao fato de eu me colocar acima dos outros, descobrindo que eu próprio não sou coerente com meus ideias. Na medida em que prezo os outros e não mais os desprezo, também não preciso mais desprezar a mim mesmo. A nova visão do outro me libertará da imagem falsa que tenho de mim mesmo, que é a causa de minha tristeza. 
Muitos dos ferimentos que arrastamos conosco de um lado para outro nos foram impingidos por pessoas, por pais e educadores, por invejosos e pessoas que não estão em unidade consigo mesmas. Um conselho que nos dão os Padres é que devemos reconciliar-nos com os ferimentos e descobrir ali o cerne de nossa doença. 
Se quiseres sanar os ferimentos terríveis da alma, deves suportar o que o médico te receita. Quem está doente não gosta de sofrer amputações ou purificações. Não gosta de se lembrar de que está doente, mas no fundo está convencido de que não poderá ser curado de sua doença sem esse tratamento. E assim suporta aquilo que o médico lhe receita. Sabe que ficará curado de uma longa doença mediante um pequeno desprazer. O médico Jesus liberta da glória vã. Quem foge de uma prova útil foge da vida eterna. Quem é, pois, que ajuda Santo Estêvão a ter tal glória, se não aqueles que o apedrejam? 
Os ferimentos que os outros me infligem revelam minha própria doença. 

GRUN, Anselm. A orientação espiritual dos Padres do deserto. Petrópolis: Vozes. 2013 

sexta-feira, 3 de março de 2017

Amem a cruz, não com amor sensível mas racional e sobrenatural

Quando se vos diz que deveis amar a cruz, não se pretende referir a um amor sensível. Isso é contra a natureza humana. Devereis, pois, distinguir três espécies de amor: o amor sensível, o amor racional, o amor fiel e supremo. Com outras palavras, o amor que procede da parte inferior e que é carnal; o amor que procede da parte superior e que é a razão; e o amor que está acima do espírito, ou amor supremo, e que é a inteligência, iluminada pela fé. 
Deus não vos pede para amardes a cruz de maneira sensível. A vossa "vontade da carne", na verdade, é inteiramente propensa ao mal e a que dele procede resulta manchado; daí que não aceitará submeter-se, por vontade própria, à vontade divina e à sua lei, que não dispensa a cruz. 
Referindo-se a esta "vontade da carne", Jesus no Jardim das Oliveiras, exclamava: "Pai, não se faça a minha, mas a tua vontade". Ora, se a parte sensível da própria humanidade de Cristo, apesar de santa, não pôde amar de imediato a cruz, quanto mais não será tentada a rejeitá-la a nossa sensibilidade, que é toda corrupta. Talvez possamos, por vezes - a exemplo de muitos santos - saborear até o prazer sensível da cruz, mas esse prazer não procede dos sentidos, ainda que more no reino da sensibilidade; ele procede da parte mais nobre da alma que está tão repleta de felicidade do Espírito Santo que a faz transbordar para a parte sensível. E assim, até a pessoa mais crucificada poderá exclamar: "O meu coração e a minha carne estremecem de alegria no Deus vivo". 

SÃO LUIS DE MONTFORT. Carta aos amigos da Cruz. São Paulo: Cléofas. 2014

quinta-feira, 2 de março de 2017

A GRANDE QUARESMA

Os evangelhos falam dum tempo de solidão que Jesus passou no deserto, imediatamente depois de ter sido baptizado por João: «Impelido»pelo Espírito para o deserto, Jesus ali permanece sem comer durante quarenta dias. Vive com os animais selvagens e os anjos servem-n'O.
No fim desse tempo, Satanás tenta-O por três vezes, procurando pôr em causa a sua atitude filial para com Deus; Jesus repele esses ataques, que recapitulam as tentações de Adão no paraíso e de Israel no deserto; e o Diabo afasta-se d'Ele «até determinada altura» (Lc 4, 13).
Os evangelistas indicam o sentido salvífico deste acontecimento misterioso, Jesus é o Novo Adão, que Se mantém fiel naquilo em que o primeiro sucumbiu à tentação. Jesus cumpre perfeitamente a vocação de Israel: contrariamente aos que outrora, durante quarenta anos, provocaram a Deus no deserto, Cristo revela-Se o Servo de Deus totalmente obediente à vontade divina. Nisto, Jesus vence o Diabo: «amarrou o homem forte», para lhe tirar os despojos. A vitória de Jesus sobre o tentador, no deserto, antecipa a vitória da paixão, suprema obediência do seu amor filial ao Pai.
A tentação de Jesus manifesta a maneira própria de o Filho de Deus ser Messias, ao contrário da que Lhe propõe Satanás e que os homens desejam atribuir-Lhe. Foi por isso que Cristo venceu o Tentador, por nós: «Nós não temos um sumo-sacerdote incapaz de se compadecer das nossas fraquezas; temos um, que possui a experiência de todas as provações, tal como nós, com excepção do pecado» (Heb 4, 15). Todos os anos, pelos quarenta dias da Grande Quaresmaa Igreja une-se ao mistério de Jesus no deserto.

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA - parágrafos 538-540

quarta-feira, 1 de março de 2017

Quaresma

Vem do latim quadragesima dies (o dia quadragésimo antes da Páscoa). É o tempo de preparação "pelo qual se sobe ao monte santo da Páscoa", como o descreve o Cerimonial dos Bispos. Começa na Quarta-Feira de Cinzas e termina na tarde de Quinta-feira Santa, antes da Missa vespertina da Ceia do Senhor, com que se inaugura o Tríduo Pascal. 
Organizou-se a Quaresma a partir do século IV. A sua história anterior não é muito clara. Parece que o seu germe original foi um jejum pascal de dois dias, na Sexta e no Sábado antes do Domingo da Ressurreição, espaço que, pouco a pouco, se alargou para uma semana, depois para três e, segundo as diversas regiões, sobretudo nas do Oriente, como o Egito, até para seis semanas ou quarenta dias. Em Roma, a Quaresma já estava constituída entre os anos 350 e 380. 
Para dar sentido a esse período, como preparação da Páscoa, teve certamente grande influência o simbolismo bíblico do número quarenta: os episódios de quarenta dias do dilúvio, antes da aliança com Noé; de Moisés e os seus quarenta dias no monte; do Povo de Israel e os seus quarenta anos pelo deserto; de Elias caminhando quarenta dias para o monte do encontro com Deus; e, sobretudo, os quarenta dias de Jesus no deserto, antes de começar a sua missão messiânica. Esses episódios têm em comum o significado de um tempo de prova, de purificação e de preparação para um acontecimento importante e salvador. "Todos os anos, pelos quarenta dias da Grande Quaresma, a Igreja une-se ao mistério de Jesus no deserto" (CIC 540). 

ALDAZÁBAL, José. Vocabulário Básico de Liturgia. São Paulo: Paulinas. 2013